As assembleias são atos absolutamente tradicionais, posto que realizadas da mesma forma há pelo menos 2.500 anos. São derivadas das antigas ágoras gregas, palco no qual os assuntos de interesse geral das pólis (antigas cidades-estado gregas) eram definidos.

Atual cenário das assembleias virtuais

Por esse motivo, é natural e até compreensível a ocorrência de certa resistência para o reconhecimento uníssono da aplicabilidade das assembleias realizadas eletronicamente. É certo que outro modelo de reunião de pessoas, em que pese não seja inovador, rompe com o formato tradicional, que pressupunha a presença de cada um dos indivíduos em um único ambiente presencial a fim de propiciar a sustentação oral das ideias e a deliberação dos assuntos pautados.

Juridicamente, no Brasil, a possibilidade de realização de assembleias na modalidade virtual teve sua origem na Medida Provisória 517/2010, que autorizava as companhias de capital aberto (S.A) a concretização de atos assembleares online tendo, mais adiante, com a Lei 12.431/2011, culminado com a criação do parágrafo único do artigo 121 da Lei das S.A, que assim versava: “Nas companhias abertas, o acionista poderá participar e votar a distância em assembleia geral, nos termos da regulamentação da Comissão de Valores Mobiliários”.

Não demorou para que a realização de assembleias na modalidade virtual chamasse a atenção do mercado condominial, pois os condomínios possuem pontos de convergência com as sociedades empresárias, haja vista que os condôminos são “sócios” uns dos outros (sem affectio societatis – vontade de ser sócio) e as despesas são rateadas na proporção das frações ideais/forma definida pela convenção (art. 1.336, inc. I, CC – quotas do capital social integralizado).

Antes mesmo da pandemia do Covid-19, alguns projetos de lei, dentre eles o PL 548/2019, de autoria da Senadora Soraya Thronicke visavam possibilitar a realização de assembleias condominiais na modalidade virtual, com fundamento no princípio da legalidade constante do artigo 5º, inc. II, da Constituição Federal: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

Os críticos do tema sustentavam que, para a viabilização das assembleias virtuais nos condomínios, seria imprescindível, por conta da redação do artigo 1.350 do Código Civil, fazer previsão expressa na convenção, conquanto estas seriam realizadas no tempo e forma lá previstos.

A pandemia do Covid-19 (março de 2020) serviu, em verdade, como um catalizador de procedimentos, abreviando o tempo de maturação de inúmeras tomadas de consciência, dentre as quais encontram-se as assembleias virtuais.

A catálise foi tão fugaz que, em 10 de junho de 2020, entrou em vigor a Lei 14.010, tendo sido autorizado, durante o período de duração da pandemia, cujo término estimou-se em 30 de outubro de 2020, a realização de atos assembleares virtuais em condomínio, conforme previsto pelo artigo 12 da citada lei.

Pouco mais de mês depois, no dia 28 de julho de 2020, foi sancionada a Lei 14.030, que fora responsável pela criação de novo parágrafo único do artigo 121 da Lei das S.A e do artigo 1.080-A do Código Civil, cuja redação têm servido para fundamentar analogicamente a realização de assembleias virtuais em condomínios, ainda que sem previsão junto à convenção. Diversas foram as decisões judiciais neste sentido, valendo anotar a sentença proferida nos autos 5013604-82.2020.8.24.0038, originada pela 2ª Vara Cível da Comarca de Joinville/SC, que ganhou repercussão nacional pelo pioneirismo.

Atualmente, a maioria das serventias de Registro de Pessoas Jurídicas (cartórios onde as atas de assembleia são registradas), vem entendendo que a motivação pela qual o artigo 11 da Lei 14.010/2020 foi concebido ainda não cessou, haja vista que a pandemia ainda continua produzindo efeitos, e por isso continua registrando as respectivas atas assembleares, sobretudo porque o Provimento 95 do CNJ encontra-se prorrogado até a data de 31 de março de 2021, e exclui a exigência de assinatura realizadas eletronicamente com certificado digital validados pelo ICP Brasil (Infraestrutura de Chaves Públicas).

No entanto, há aqueles registradores legalista que entendem terem os efeitos do artigo 11 da Lei 14.010/2020 cessado no dia 30 de outubro de 2020, de modo que têm rejeitado o registro de todas as atas das assembleias virtuais realizadas a partir do dia 31 de outubro de 2020. Os fundamentos utilizados são justamente a ausência de previsão na convenção condominial e o encerramento da vigência do artigo 11 da Lei 14.010/2020.

Portanto, a legalidade das assembleias virtuais é algo que já não mais se questiona. Com efeito, neste instante, a insegurança jurídica gravita em torno da ausência de entendimento unificado dos titulares das serventias de registro de pessoas jurídicas, fator que poderá implicar na negativa de registro das atas das assembleias realizadas na modalidade online.

A modificação deste cenário de insegurança jurídica dependerá do engajamento do mercado condominial e do esforço a ser empreendido pelas entidades de classe, a exemplo da ASDESC – Associação de Síndicos do Estado de Santa Catarina, que após conversa com o Deputado Federal Rodrigo Coelho, teve encampada a demanda envolvendo as assembleias virtuais, dando, assim, ensejo a propositura do PL 5563/2020, protocolado no dia 16 de dezembro de 2020, cujo escopo visa a criação do artigo 1.353-A junto ao Código Civil, que assim dispõe:

“Art. 1.353-A. A assembleia condominial, inclusive para os fins dos arts. 1.349 e 1.350, e a respectiva votação poderão ocorrer por meios virtuais, caso em que a manifestação de vontade de cada condômino será equiparada, para todos os efeitos jurídicos, à sua assinatura presencial”.

O caminho da pacificação ainda é longo e pressuporá a obtenção de apoio de todos os atores que compõem o cenário condominial nacional. Façamos a nossa parte!

 

 

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Gustavo Camacho é advogado, sócio da Camacho Advogados, pós-graduado em direito processual civil, pós-graduado em direito Civil e empresarial, LLM em direito empresarial, pós-graduando em direito Imobiliário, líder coach, diretor jurídico adjunto da ASDESC, presidente da comissão de direito do consumidor da OAB Joinville, articulista de jornais e revistas especializadas em condomínios.

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